30 de outubro de 2007

"Mulher é gente tão infeliz..."


Queria eu lá viver perto de chefes? Careço é de pousar longe das pessoas de mando, mesmo de muita gente conhecida. Sou peixe de grotão. Quando gosto, é sem razão descoberta, quando desgosto, também. Ninguém, com dádivas e gabos, não me transforma.

( O Cavaleiro da Rosa do Burgo do Coração, em GS: V)
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28 de outubro de 2007

Kalu


[Humberto Teixeira]

Kalu, Kalu
Tira o verde desses óios di riba d'eu
Kalu, Kalu
Não me tente se você já me esqueceu
Kalu, Kalu
Esse oiá despois do que se assucedeu
Cum franqueza só n'um tendo coração
Fazê tal judiação
Você tá mangando d'eu
Com franqueza só não tendo coração
Fazê tal judiação
Você tá mangando d'eu

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25 de outubro de 2007

A vida nem é da gente...


{Guimarães Rosa, no Grande Sertão}

Mire veja o senhor tudo o que na vida se estorva, razão de pressentimentos. (p.150)

O senhor sabe, se desprocede: a ação escorregada e aflita, mas sem sustância narrável. (p.152)

Quem desconfia, fica sábio. (p.154)

Eu queria ir para ele, para abraço, mas minhas coragens não deram. Porque ele faltou com o passo, num rejeito, de acanhamento.

Comigo, as coisas não têm hoje e ant'ôntem amanhã: é sempre. (p.156)

Tormentos. Sei que tenho culpas em aberto. Mas quando foi que minha culpa começou? O senhor por ora mal me entende, se é que no fim me entenderá. Mas a vida não é entendível.

Qualquer coisa que ele falasse, para mim virava sete vezes. (p.160)

Deus vem, guia a gente por uma légua, depois larga. Então, tudo resta pior do que antes. Esta vida é de cabeça-para-baixo, ninguém pode medir suas pêrdas e colheitas.

A gente vive, eu acho, é mesmo para se desiludir e desmisturar. A senvergonhice reina, tão leve e leve pertencidamente, que por primeiro não se crê no sincero sem maldade. (p.162)

Mas eu gostava dele, dia mais dia, mais gostava. Diga o senhor: como um feitiço? Isso. Feito coisa-feita. Era ele estar perto de mim, e nada me faltava. Era ele fechar a cara e estar tristonho, e eu perdia meu sossego. Era ele estar por longe, e eu só nele pensava.

De ninguém eu era. Eu era de mim. (p.167)

Esta vida está cheia de ocultos caminhos. Se o senhor souber, sabe; não sabendo, não me entenderá. (p.170)

Eu não podia tão depressa fechar meu coração a ele. Sabia disso. Senti. (p.171)

Daquela mão, eu recebia certezas. Dos olhos. Os olhos que ele punha em mim, tão externos, quase tristes de grandeza. Deu alma em cara. (p.172)

A amizade dele, ele me dava. E amizade dada é amor.

"toda alegria, no mesmo momento, abre saudade" (p.173)

Passarinho cai de voar, mas bate suas asinhas no chão. (p.173)

Artes de morte e amor têm paragens demarcadas. (p.174)

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21 de outubro de 2007

Dia de desexistir


[Guimarães Rosa, sempre]

Me faltou certeza para responder a ele o que eu estava achando. Que vontade era de pôr meus dedos, de leve, o leve, nos meigos olhos dele, ocultando, para não ter de tolerar de ver assim o chamado, até que ponto esses olhos, sempre havendo, aquela beleza verde, me adoecido, tão impossível. (p.62)


Ah, se eu pudesse mesmo gostar dele - os gostares... (p.66)

Confiança - o senhor sabe - não se tira das coisas feitas ou perfeitas: ela rodeia é o quente da pessoa. (p.72)

Um está sempre no escuro, só no último derradeiro é que clareiam a sala. (p.80)

Bela é a lua, lualã, que torna a se sair das nuvens, mais redonda recortada. (p.89)

Tem horas em que penso que a gente carecia, de repente, de acordar de alguma espécie de encanto. As pessoas e as coisas, não são de verdade! E de que é que, a miúde, a gente adverte incertas saudades? (p.100)

O mal ou o bem, estão é em quem faz; não é no efeito que dão. (p.113)

Tem horas antigas que ficam muito mais perto da gente do que outras, de recente data. (p.115)

Eu queria decifrar as coisas que são importantes.

O que induz a gente para más ações estranhas, é que a gente está pertinho do que é nosso, por direito, e não sabe, não sabe, não sabe?

Ao dôido, doideiras digo. (p.116)

Tive medo. Sabe? Tudo foi isso: tive medo! (p.121)

Muita coisa importante falta nome. (p.125)

Mas, onde é bobice a qualquer resposta, é aí que a pergunta se pergunta. (p.126)

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18 de outubro de 2007

Ei, ei, aí todos esbarram.

[Guimarães Rosa]

Olhe, o que devia de haver era de se reunirem-se os sábios, políticos, constituições gradas, fecharem o definitivo a noção – proclamar por uma vez, artes assembléias, que não tem diabo nenhum, não existe, não pode. Valor de lei! Só assim davam tranqüilidade boa à gente. Por que o Governo não cuida?

(Grande Sertão: Veredas, página 31 da MINHA edição)
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A distância


[Roberto Carlos]

imagem: Juarez Machado

Nunca mais você ouviu falar de mim
Mas eu continuei a ter você
Em toda esta saudade que ficou
Tanto tempo já passou e eu não te esqueci
Quantas vezes eu pensei voltar
E dizer que o meu amor nada mudou
Mas o meu silêncio foi maior
E na distância morro todo dia sem você saber
O que restou do nosso amor ficou
No tempo esquecido por você
Vivendo do que fomos ainda estou
Tanta coisa já mudou, só eu não te esqueci
Quantas vezes eu pensei voltar
E dizer que o meu amor nada mudou
Mas o meu silêncio foi maior
E na distância morro todo dia sem você saber
Eu só queria lhe dizer que eu
Tentei deixar de amar não consegui
Se alguma vez você pensar em mim
Não se esqueça de lembrar
Que eu nunca te esqueci
Quantas vezes eu pensei voltar
E dizer que o meu amor nada mudou
Mas o meu silêncio foi maior
E na distância morro todo dia sem você saber
Quantas vezes eu pensei voltar
E dizer que o meu amor nada mudou
Mas o meu silêncio foi maior
E na distância morro todo dia sem você saber
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17 de outubro de 2007

Sigamos em linha reta, reta, reta...


"Florentino Ariza não deixara de pensar nela um único instante desde que Fermina Daza o rechaçou sem apelação depois de uns amores longos e contrariados, e haviam transcorrido a partir de então cinqüenta e um anos, nove meses e quatro dias."

{O amor nos tempos do cólera, Gabriel García Márquez}

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7 de outubro de 2007

Nonada



{Guimarães Rosa}

Mas a gente quase somente faz o que a bobagem do mundo quer.

(Corpo de Baile, página 220)


imagem de 'amor à flor da pele'

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Nenhum, nenhuma.



Se eu, se você gostar de mim... E como saber se é o amor certo, o único? Tanto é o poder errar, nos enganos da vida... Será que você seria capaz de se esquecer de mim, e, assim mesmo, depois e depois, sem saber, sem querer, continuar gostando? Como é que a gente sabe?

A Moça disse ao moço: - "Você ainda não sabe sofrer..." - e ela tremia como os ares azuis.

Eles se olhavam para não-distância, estiadamente, sem saberes, sem caso.

Não reconhecia ninguém, alheada de fim, só um pensar sem inteligência, imensa omissão, e já condenados segredos - coração imperceptível.

As lembranças são outras distâncias.

(texto do guimarães rosa, imagem do kurt halsey)
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Como és bela e fugaz, vida!


(Guimarães Rosa)

"Deus nos dá pessôas e coisas, para aprendermos a alegria... Depois, retoma coisas e pessôas, para ver se já somos capazes da alegria sozinha. Essa - a alegria que ele quer..."

Corpo de Baile, página 816.

imagem: suzanne woolcott
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Um moço muito branco


{Guimarães Rosa}

Tão branco; mas não branquicelo, senão de um branco leve, semidourado de luz: fulgurando ter por dentro da pele uma segunda claridade.

Só aquela intenção sonhosa, o certo cansaço do ar.

Ele estava nas altas atmosferas, aumentava sua presença.

Ele andava muito na lua, passeava por todo o lugar e alhonde, praticando aquela liberdade vaporosa e o espírito de solidão; parecesse alquebrado de um feitiço, segundo os dizeres do povo.

De estranha memória, só, pois, a de olhar ele sempre para cima, o mesmo para o dia que para a noite - espiador de estrelas.


Com a primeira luz do sol, o moço se fora, tidas asas.


Ele cintilava ausente, aconteceu.

imagem: Chagall
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Amor é só amor


{Do vovô Guimarãs Rosa para a netinha Vera Lúcia}