31 de dezembro de 2008

Poema de reis

[Guima, em Sagarana]

E eu, que vinha vivendo o visto mas vivando estrelas, e tinha um lápis na algibeira, escrevi também, logo abaixo:

Sargon
Assarhaddon
Assurbanipal
Teglattphalasar, Salmanassar
Nabodi, Naopalassar, Nabucodonosor
Belsazar
Sanekherib.

E era para mim um poema esse rol de reis leoninos, agora despojados da vontade sanhuda e só representados na poesia. Não pelos cilindros de ouro e pedras, postos sobre as reais comas riçadas, nem pelas alargadas barbas, entremeadas de fios de ouro. Só, só por causa dos nomes.

Amante Amado



(Uma do "pipoca moderna". Estou ouvindo por causa de um moço pidão que quer que eu envie o cd pra ele)

[Jorge Ben]


Eu quero que você me pegue
Me abrace e me aperte
Me beije e me ame
E depois me mande embora
Que eu vou feliz da vida, amor
Quero ser mandado
Adorado
Acariciado
Machucado
E amado por você
E depois pode me mandar embora
Mesmo que sejam quatro horas da amanhã, chovendo
Fazendo frio, amor
E me proibindo de olhar pra outra mulher qualquer
Pois eu vou feliz da vida, vitorioso
Pois eu sou o seu escravo, amor
Pois eu sou o seu amante amado, amor

___________________

* Rafael, teu cd tá ficando sumpimpa. mas não deu pra enviar pro niver. Em breve estará aí. Essa é do Jorge Ben, mas tá no Pipoca Moderna.

30 de dezembro de 2008

A dor inominada do seu amor, porém, foi sempre esta: exigirem-lhe que limitasse essa entrega.


O destino gosta de inventar desenhos e figuras. A sua dificuldade reside no que é complicado. A própria vida, porém, tem a dificuldade da simplicidade. Só tem algumas coisas de uma dimensão que nos excede. O santo, declinando o destino, escolhe estas coisas por amor a Deus. Mas que a mulher, segundo a sua natureza, tenha de fazer a mesma escolha em relação ao homem, isso evoca a fatalidade de todos os laços de amor: decidida e sem destino, como um ser eterno, fica ao lado dele, que se transformará. Sempre a amante ultrapassa o amado, porque a vida é maior do que o destino. A sua entrega quer ser sem medida: esta é a sua felicidade. A dor inominada do seu amor, porém, foi sempre esta: exigirem-lhe que limitasse essa entrega.

Rilke, "As Anotações de Malte Laurids Brigge"
[Caio Fernando Abreu]

Vai passar, tu sabes que vai passar. Talvez não amanhã, mas dentro de uma semana, um mês ou dois, quem sabe? O verão está ai, haverá sol quase todos os dias, e sempre resta essa coisa chamada "impulso vital". Pois esse impulso às vezes cruel, porque não permite que nenhuma dor insista por muito tempo, te empurrará quem sabe para o sol, para o mar, para uma nova estrada qualquer e, de repente, no meio de uma frase ou de um movimento te supreenderás pensando algo como "estou contente outra vez". Ou simplesmente "continuo", porque já não temos mais idade para, dramaticamente, usarmos palavras grandiloqüentes como "sempre" ou "nunca". Ninguém sabe como, mas aos poucos fomos aprendendo sobre a continuidade da vida, das pessoas e das coisas. Já não tentamos o suicidio nem cometemos gestos tresloucados. Alguns, sim - nós, não. Contidamente, continuamos. E substituimos expressões fatais como "não resistirei" por outras mais mansas, como "sei que vai passar". Esse é o nosso jeito de continuar, o mais eficiente e também o mais cômodo, porque não implica em decisões, apenas em paciência.Claro que no começo não terás sono ou dormirás demais. Fumarás muito, também, e talvez até mesmo te permitas tomar alguns desses comprimidos para disfarçar a dor. Claro que no começo, pouco depois de acordar, olhando à tua volta a paisagem de todo dia, sentirás atravessada não sabes se na garganta ou no peito ou na mente - e não importa - essa coisa que chamarás com cuidado, de "uma ausência". E haverá momentos em que esse osso duro se transformará numa espécie de coroa de arame farpado sobre tua cabeça, em garras, ratoeira e tenazes no teu coração. Atravessarás o dia fazendo coisas como tirar a poeira de livros antigos e velhos discos, como se não houvesse nada mais importante a fazer. E caminharás devagar pela casa, molhando as plantas e abrindo janelas para que sopre esse vento que deve levar embora memórias e cansaços. Contarás nos dedos os dias que faltam para que termine o ano, não são muitos, pensarás com alívio. E morbidamente talvez enumeres todas as vezes que a loucura, a morte, a fome, a doença, a violência e o desespero roçaram teus ombros e os de teus amigos. Serão tantas que desistirás de contar. Então fingirás - aplicadamente, fingirás acreditar que no próximo ano tudo será diferente, que as coisas sempre se renovam. Embora saibas que há perdas realmente irreparáveis e que um braço amputado jamais se reconstituirá sozinho. Achando graça, pensarás com inveja na largatixa, regenerando sua própria cauda cortada. Mas no espelho cru, os teus olhos já não acham graça. Tão longe ficou o tempo, esse, e pensarás, no tempo, naquele, e sentirás uma vontade absurda de tomar atitudes como voltar para a casa de teus avós ou teus pais ou tomar um trem para um lugar desconhecido ou telefonar para um número qualquer (e contar, contar, contar) ou escrever uma carta tão desesperada que alguém se compadeça de ti e corra a te socorrer com chás e bolos, ajeitando as cobertas à tua volta e limpando o suor frio de tua testa. Já não é tempo de desesperos.

28 de dezembro de 2008

Blindness, finalmente!

Hoje vi Blindness. É, prefiro o título em inglês. Sempre achei "blind" uma palavra forte. Bom, 80% dos meus amigos já tinham visto em cidades onde os filmes chegam quando devem. Finalmente chegou a minha vez. O cinema estava cheio e só uns poucos bobinhos saíram antes do fim. Nunca li Saramago, mas já era apaixonada pelo Meirelles. Não por causa de Cidade de Deus e O Jardineiro Fiel (embora goste de ambos), mas por causa do vídeo em que ele beija carinhosamente o Saramago. Outros fatores causadores de paixão estão relacionados às entrevistas que assisti, ao jeito de menino radiante e entusiasmado e aos olhos verdes sempre brilhando. Mas isso não vem ao caso. O que vem ao caso é que o filme é realmente bom. Eu, pelo menos, gostei. Conseguiu me prender do início ao fim. Conseguiu me fazer sentir envolvida. Conseguiu me fazer comemorar e sorrir com um ato homicida! As cenas não são tão fortes quanto eu imaginava (o Meirelles deve ter cortado bastante mesmo), mas conseguem causar impacto do mesmo jeito. O pensamento que não me saía da cabeça era: ainda bem que a Julianne Moore é quem enxerga, não o Gael. Em terra de cegos, quem tem um olho é rei. E o quanto dói enxergar! O quanto somos realmente idiotas dando valor ao que os olhos vêem... jóias, ouro, sapatos, roupas. Nada vale nada. De repente lembrei de Ari, que é a favor daquilo que ele chama de "refeudalização do mundo". No campo, cegos poderiam produzir o próprio alimento. Mas como fazer comida brotar do asfalto de NY? Enlatados um dia acabam se não houver ninguém pra continuar produzindo. E as pessoas matam e morrem por causa da(s) fome(s). Ah, nem preciso falar que sempre me horroriza a crueldade humana, né? Do início ao fim as coisas deste filme me dão nojo. Mas é bom sentir nojo de vez em quando. Pelo menos isso me fez sair da apatia, sentir raiva...

Aaaaaaah e a trilha do Uakti? Ele escolheu a trilha certa. Daqui pra frente eu vou começar a achar que Uakti é música pra cegos. Que agonia aquela cegueira branca permeada de música, de ruído, de silêncio, de egoísmo, de dor. Deus nos livre de uma epidemia como aquela. Lembrei também das epidemias que assolaram Macondo, todas igualmente horrorosas. E mais uma vez vi o quanto os homens (me refiro aqui não à humanidade, mas ao sexo masculino) podem ser nojentos. O quanto somos bichos. Como somos pouco civilizados. Como realmente não há igualdade entre nós. O quanto a polícia é idiota em qualquer lugar do mundo. Enfim.. como tudo pode ser terrível se não enxergarmos ou tivermos alguém pra nos guiar. Por fim, o quanto a cegueira pode ser cômoda ou útil para alguns. O quanto sofrem aqueles que escolhem fazer o bem. O quanto me sinto mal com filmes eficientes assim. Nessas horas eu páro pra pensar sobre dignidade (como o casal oriental do filme) e ética. What diabos de mundo é esse, meu Deus? Como é raro alguém olhar pro outro e enxergar o outro como um eu. Como é difícil dizer apenas uma palavra que faça o outro se sentir bem. Como é raro alguém se dipor a ajudar pessoas frágeis e perdidas. Ah, enfim. Esse texto não vai ter um final bonito, é só um desabafo mesmo. O filme é bom.

27 de dezembro de 2008

Ame o amor que o ama duradouramente, pois quanto mais amá-lo, mais Ele o amará.


[Ruysbroeck]

"Se pudéssemos renunciar a nós mesmos e a todo o egoísmo em nosso trabalho, deveríamos, com nosso espírito nu de imagens, transcender todas as coisas, e sem intermediários ser conduzidos pelo Espírito de Deus até a Nudez... Quando transcendermos a nós mesmos, e nos tornarmos, em nossa ascensão para Deus, tão simples que o amor nu das alturas possa nos tomar, onde o amor abraça o amor, acima do exercício de qualquer virtude - isto é, em nossa Origem, de Onde nascemos espiritualmente - então cessamos, e nós e toda nossa individualidade morre em Deus".

______________

Infelicidade é questão de prefixo.


(acho que nunca postei essa frase aqui, mas é uma das minhas prediletas do Guima. Well, hoje o post vai/foi pra Aline, pois é o aniversário dela: capricorniana, como eu. Historiadora, como eu. Paulistana do Cambuci, como eu. Rosiana, como eu. E queridíssima, muito querida. Aline, que você fique sempre feliz. Hoje, no niver, e sempre! Muitos céus azuis, sóis e abraços apertados!)

22 de dezembro de 2008

Exorcizando a Sandy que há em mim (Listening to Amy Winehouse)



Just frieds

I wanna touch you
But that just hurts

---

Love is a losing game

For you I was a flame
Love is a losing game
Five story fire as you came
Love is a losing game

Why do I wish I never played
Oh, what a mess we made
And now the final frame
Love is a losing game

---

Me & mr Jones

No, you ain't worth guest list
Plus one of all them girls you kiss
You can't keep lying to yourself like this
Can't believe you played yourself (out) like this

What kind of fuckery are we?
Nowadays you don't mean dick to me

(...)

But I could swear that we were through
I still wonder 'bout the things you do

---

Wake up alone

The dark covers me and I cannot run now
My blood running cold
I stand before him
It's all I can do to assure him
When he comes to me
I drip for him tonight
Drowning in me we bathe under blue light

---

21 de dezembro de 2008

Anotações sobre um amor urbano



[Caio Fernando Abreu]


Pelas escadarias da avenida deserta, lata de coca-cola largada na porta da igreja, aqui parece que o tempo não passou, quero te mostrar um vitral, esta sacada, aquele balcão como os de Lorca, entremeado de rosas, quero dividir meu olhar, desaprendi de ver sozinho e agora que tudo perdeu a magia, se magia houve, e havia, e não consigo mais ver nenhum anjo em você, pastor, mago, cigano, herói intergaláctico, argonauta, repercante, e agora que vejo apenas um rapaz dentro do qual a morte caminha inexorável, só não sabemos quando o golpe final, mas virá, cabelos tão negros, rosto quase quadrado, quase largo, quase pálido onde já começou a devastação, olhos perdidos, boca de naufrágio vermelho pesado sobre o escuro da barba malfeita, olho tudo isso que vejo e não tem outra magia além dessa, a de ser real, e vou dizendo lento, como quem tem medo de quebrar a rija perfeição das coisas, e vou dizendo leve, então, no teu ouvido duro, na tua alma fria, e vou dizendo leve, e vou dizendo longo sem pausa - gosto muito de você de você muito de você.

imagem: Vollotton

Plain gold ring


[Nina Simone canta...]

Plain gold ring on his finger he wore
It was where everyone could see
He belonged to someone, but not me
On his hand was a plain gold band

Plain gold ring has a story to tell
It was one that I knew too well
In my heart it will never be spring
Long as he wears a plain gold ring

When nighttime comes a' callin' on me
I know why I will never be free
I can't stop these teardrops of mine
I'm gonna love him till the end of time

Plain gold ring has but one thing to say
I'll remember till my dying day
In my heart it will never be spring
Long as he wears a plain gold ring
Plain gold ring on his finger he wore
Plain gold ring on his finger he wore
Plain gold ring on his finger he wore

18 de dezembro de 2008

Atentai bem, ô bacuraus!


A oratória hipnotizante de Mão Santa

[Daniela Pinheiro]


À diferença da maioria dos colegas de plenário, o senador piauiense Mão Santa só discursa de improviso. “Falo o que sinto na hora”, afirma. No ano passado, ele subiu à tribuna 252 vezes, perdendo apenas para o líder da oposição, o senador Arthur Virgílio. Ainda assim, há um quesito em que reina absoluto: o aparte. Mão Santa é o senador que mais interrompe o discurso dos colegas para “pedir a palavra”. No último ano, pronunciou a frase “O senador me concede um aparte?”, ou alguma variação dela, em 372 ocasiões. Desde que chegou ao Congresso, foram 1 330 vezes.

Cirurgião nascido em Parnaíba, no extremo norte do Piauí, Francisco de Assis Moraes Souza ganhou o apelido de “Mão Santa” depois que um paciente de condição modesta espalhou pela cidade que havia sido curado por aquele “doutor de mãos santas”. Construiu sua carreira política em partidos como a Arena e o PDS até chegar ao PMDB. Administrou o Piauí de 1995 a 2001, quando se tornou o primeiro governador cassado do país, acusado de uso da máquina pública na campanha de reeleição. Em 2002, foi eleito senador com 664 mil votos. Em cinco anos de mandato, apresentou cinco projetos no Congresso.

Seus discursos, proferidos com entonação mercuriana, são uma salada de citações que mistura filósofos gregos, artistas, políticos, pensadores contemporâneos, mártires, reis, ditadores, escritores, cientistas, personagens bíblicos, juristas ou qualquer pessoa que játenha lhe dito algo especial. É capaz de juntar num único pronunciamento — sobre o Dia da Mulher ou sobre a cassação de Renan Calheiros, não importa — frases de figuras tão díspares como Stalin e dom João VI.

Numa observação sobre o mensalão, por exemplo, ele reuniu filosofia, autoajuda empresarial e axé music para criticar o governo: “Sócrates, o filósofo que orientou a Antigüidade, ensinou humildade quando disse: ‘Só sei que nada sei’. Peter Drucker, que é tido como o Sócrates
do mundo moderno, diz: ‘Não vai existir liderança se não houver integridade, credibilidade, honestidade e confiança’. E isso ‘acabô-ô-ô’, como canta o Ricardo Chaves na Bahia. Acabou com Ali Babá e os Quarenta Ladrões!”, exclamou a seus pares em plenário.

Uma tarde, em janeiro, durante o recesso parlamentar, Mão Santa chegou a seu gabinete acompanhado da mulher, Adalgisa, sua suplente. Usava jeans escuro, uma camisa social listada e sapato preto lustroso. Aos 65 anos, precisava de um retoque na tintura loiro-acinzentada do cabelo. A pedido, comentou sua eloqüência verbal: “Eu falo a lingua-gem do povo”, disse.

Seus discursos seguem uma fórmula padrão. “Começo com uma frase de impacto, uma coisa intelectual, e depois destrincho”, o que significa ilustrá-la com situações do cotidiano, como uma viagem, um jantar ou uma festa. Foi o que fez, há alguns meses, para criticar a política de segurança do governo Lula. Primeiro, invocou o filósofo italiano Norberto Bobbio: “Bobbio, senador vitalício, disse: ‘O mínimo que se tem que exigir de um governo é segurança’”. E emendou: “Andei por Buenos Aires. Eu gosto mesmo é de ser feliz, jantar, tomar o meu vinho, fazer a digestão. E às quatro da manhã, andei de mãos dadas com a Adalgisinha, naquele bairro do cemitério onde está enterrada Eva Perón, a Recoleta... Ô, Lula, pega a dona Marisa, bela senhora, e vai andar de mãos dadas no nosso Rio de Janeiro, onde eu estudei, na bela Cinelândia. Vá! Mas, no Rio, quem consegue? Em Teresina, ninguém anda em lugar nenhum. Violência para toda parte! E isso não foi a históriado Brasil. É a história do mau governo Lula, o pior de todos os tempos!”

Quando discursa, Mão Santa costuma chamar a atenção dos senadores que estão em plenário: “Ô Tasso Jereissatti!”, “Ô Paulo Paim!” Em geral, a advertência é seguida de um aposto inventado por ele: “Ô Pedro Simon, nossoGandhi!”, “Ô Suplicy, o homem que não larga o celular mas é honesto!”, “Ô Marcelo Crivella, o homem de Deus no Senado!”, “Ô Paulo Paim, o camisa 10 do PT!” A senadora Patrícia Saboya, exmulher de Ciro Gomes, ganhou o epíteto de “Iracema dos olhos de mel e cabelos da cor das asas da graúna”. Quando percebe senadores distraídos, costuma berrar: “Atentai bem! Atentai bem!”

Num discurso sobre a epidemia de dengue, mencionou Luiz Gonzaga (“O nosso rei do baião”), Rui Barbosa, Geraldo Vandré, Napoleão Bonaparte, Simon Bolívar, dom João VI, Sófocles (“O primeiro ambientalista”), Oswaldo Cruz e Sancho Pança (“Que disse que governar é um golfo de confusão”) antes de elucubrar sobre o que o afligia: a idéia de que certamente havia uma razão para que Cuba e Colômbia tivessem conseguido erradicar a doença e o Brasil, não. “Não gosto de Fidel Castro, mas a dengue acabou por lá. E também na Colômbia. Fico a meditar: será que é porque eles fumam maconha? Então, vamos fumar, ô Papaléo!”, exortou, dirigindo-
se ao senador do Amapá.

As espetadas no presidente Lula popularizaram uma frase de Mão Santa muito repetida pelos colegas de oposição: “Há três coisas que a gente só faz uma vez na vida: nascer, morrer e votar no PT”. Sua justificativa para ter votado em Lula em 2002 é simples: “O Cão me atentou e eu votei”, explicou num pronunciamento. Os mensaleiros, aos quais prefere chamar de bacuraus— “É assim que se chama ladrão no Piauí” —, são personagens recorrentes:

“O Luiz Inácio já nomeou 24 mil aloprados! Os bacuraus de estrelinha entraram ganhando 10 mil reais!”, bradou num discurso recente.

Mão Santa diz se dedicar à leitura diariamente. Atualmente, termina A Arte da Sedução, de Robert Greene. As passagens que chamam sua atenção são destacadas a caneta, com um sublinhado em forma de cobrinha. Depois, ele as classifica segundo um sistema de pontuação em que desenha três, quatro ou cinco estrelas ao lado, na margem do livro. “As melhores são as da Bíblia”, ensina. Às vezes a quantidade de citações faz com que ele se confunda. Já afirmou que o sétimo mandamento é “não matarás”, quando o certo é “não roubarás”, e já fez uma longa explanação sobre a violência em que chamou o ex-prefeito de Nova York Rudolph Giuliani de Giuliano Gemma, o astro italiano do spaghetti western.

Sobre sua motivação para citar em cascata, ele explica: “Dou o crédito porque acho feio danado dizer a frase do outro e falar que é sua. Isso quem faz é o Nelson Jobim!” Ao tomar posse no ministério da Defesa, Jobim parafraseou o ex-primeiro-ministro britânico Benjamin Disraeli — “Nunca se queixe, nunca se explique, nunca se desculpe,
aja ou saia, faça ou vá embora” — sem mencionar a autoria. Um mês depois, Mão Santa foi à tribuna: “Esse é o retrato desse ministério, que começaroubando a frase de Disraeli! Ô Luiz Inácio, pelo amor de Deus, esse ministro já começou enganando-o, roubando a frase do ministro da rainha Vitória!”, berrou. Às gargalhadas, ele se lembra do caso: “Eu fui lá e revelei mesmo. Essa frase aí não é dele, não! Essa aí eu peguei! Essa aí eu peguei!”

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* Pura diversão! Eu "si divirto" muito com Mão Santa!

Cliquot




[Beirut]

Set fire the foundation
And burn out the station
You'll never get nothing of mine

[...]

I'll sing of the walls of the well
And the house at the top of the hill
I'll sing of the bottles of wine
That we left on our old windowsill
I'll sing of the usual spin
Getting sadder and older, oh love
...

16 de dezembro de 2008

I'm so tired

[Beatles, pela primeira vez em toda a história deste blog!]


I'm so tired, I haven't slept a wink
I'm so tired, my mind is on the blink
I wonder should I get up and fix myself a drink
No, no, no.
___________________

- brigada pelo desenho, fê. tô nessa fase de não dormir e não querer ler nem outdoor. se vir este post, mande notícias, e-mail, sinal de fumaça, cartão-postal... quero saber como estás na terra encantada. volta logo, saudade dos capuccinos!

15 de dezembro de 2008

Um dos meus preferidos do E. E. Cummings



may i feel said he
(i'll squeal said she
just once said he)
it's fun said she


(may i touch said he
how much said she
a lot said he)
why not said she


(let's go said he
not too far said she
what's too far said he
where you are said she)


may i stay said he
(which way said she
like this said he
if you kiss said she


may i move said he
is it love said she)
if you're willing said he
(but you're killing said she


but it's life said he
but your wife said she
now said he)
ow said she


(tiptop said he
don't stop said she
oh no said he)
go slow said she


(cccome?said he
ummm said she)
you're divine!said he
(you are Mine said she)

Bagatelas



[Adriana Calcanhotto e Antonio Cicero]

Eu dizia "Apareça"
Quando apareceu
Não esperava
Um dia me beijou e disse:
"Não me esqueça"
Foi embora
E só esqueci, metade...

Que bom
Que eu não tinha um revólver
Quem ama mata mais
Com bala que com flecha
Ela deixa um furo
E a porta que abriu
Jamais se fecha...

Nada disso tem moral
Nem tem lição
Curto as coisas
Que acendem e apagam
E se acendem novamente em vão...

Será que a gente
É louca ou lúcida?
Quando quer
Que tudo vire música?
De qualquer forma
Não me queixo
O inesperado quer chegar
Eu deixo...

E a gente faz
E acontece nessa vida
Nessas telas
Nessas bagatelas...

Que bom que eu
Não tinha um revólver
Será que a gente
É louca ou lúcida?
Quando quer
Que tudo vire música?...

11 de dezembro de 2008

sentia desejos irreprimíveis de se soltar e não ter papas na língua como um forasteiro

[Gabriel García Marquez, Cem Anos de Solidão]

Úrsula se perguntava se não era preferível se deitar logo de uma vez na sepultura e lhe jogarem a terra por cima, e perguntava a Deus, sem medo, se realmente acreditava que as pessoas eram feitas de ferro para suportar tantas penas e mortificações; e perguntando e perguntando ia atiçando a sua própria perturbação e sentia desejos irreprimíveis de se soltar e não ter papas na língua como um forasteiro e de se permitir afinal um instante de rebeldia, o instante tantas vezes desejado e tantas vezes adiado, para cortar a resignação pela raiz e cagar de uma vez para tudo e tirar do coração os infinitos montes de palavrões que tivera que engolir durante um século inteiro de conformismo.
— Porra! — gritou.
Amaranta, que começava a colocar a roupa no baú, pensou que ela tinha sido picada por um escorpião.
— Onde está? — perguntou alarmada.
— O quê?
— O animal!— esclareceu Amaranta.
Úrsula pôs o dedo no coração.
— Aqui — disse.

10 de dezembro de 2008

Petra Cotes

[Gabriel García Marquez, Cem Anos de Solidão, p. 198]

Petra Cotes, sem perder por um só instante o seu magnífico domínio de fera em repouso, ouviu a música e os foguetes do casamento, a barulhada enlouquecedora da festança pública, como se tudo isso não fosse nada além de uma nova travessura de Aureliano Segundo. Aos que se compadeceram da sua sorte, tranqüilizou-os com um sorriso. “Não se preocupem”, disse’. “As rainhas sempre cumprem as minhas ordens.” A uma vizinha que lhe trouxe umas velas para que iluminasse com elas o retrato do amante perdido, disse com segurança enigmática:
— A única vela que o fará vir está sempre acesa.
Tal como ela havia previsto, Aureliano Segundo voltou à sua casa imediatamente após a lua-de-mel. Trouxe os seus companheiros de sempre, um fotógrafo ambulante, e a roupa e a capa de arminho suja de sangue que Fernanda usara no carnaval. No calor da farra que se armou essa tarde, vestiu Petra Cotes de rainha, coroou-a soberana absoluta e vitalícia de Madagascar e distribuiu cópias do retrato entre os seus amigos. Ela não só se prestou à brincadeira como também se compadeceu intimamente dele, pensando que devia estar muito assustado quando imaginou aquele extravagante recurso de reconciliação. Às sete da noite, ainda vestida de rainha, recebeu-o na cama. Tinha apenas dois meses de casado, mas ela percebeu imediatamente que as coisas não andavam bem no leito nupcial e experimentou o delicioso prazer da vingança consumada.

9 de dezembro de 2008

Tu n'a pas le droit


[música que a France Gall cantava... tô numa fase francófona]


Tu n'as pas le droit
De me sourire et de m'ouvrir les bras
Puisque l'amour est mort au fond de toi
Jouer la comédie à quoi bon

Je n'accepte pas
Tu vois d'écouter encore une fois
Les mots que tu dis à d'autres que moi
J'ai ouvert les yeux pour de bon

Maintenant
Je te hais
Et pourtant
Je t'aimais

Tu as si longtemps
Voulu que je te suive aveuglément
En m'interdisant comme à une enfant
Beaucoup trop de choses sans raison

Tu pensais vraiment
Que j'allais venir pleurer simplement
Que je n'oserais pas montrer les dents
Tu m'en a donné l'occasion

Sache bien
Que je suis
Libre enfin
De ma vie

Et pour te prouver
Que tu n'existe plus dans mes pensées
Je vais t'ouvrir la porte et te chasser
Comme on le fait pour un démon

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L’artiste c’est un brave homme totalement inadapté....


[Trois hommes dans un salon : Brassens, Brel, Ferré: texte de la table ronde]

- Quoi que fassiez, vous êtes toujours seuls ? Est-ce à dire que, pour faire de grandes et belles choses il faut être seul et malheureux ? *

FERRÉ :
Ah oui ! Les seules choses valables se font dans la tristesse et la solitude. Je crois que l’art est une excroissance de la solitude. Les artistes sont seuls…

BREL : L’artiste c’est un brave homme totalement inadapté qui n’arrive qu’à dire publiquement ce qu’un type normal dit à sa bobonne le soir.

FERRÉ : Plutôt ce qu’un type normal pourrait dire à sa femme le soir.

BRASSENS : Quelquefois, il le dit mieux, quand même ! [rires]

BREL : Oui, mais l’artiste, c’est un timide, c’est un type qui n’ose pas aborder les choses " de face " comme on dit, et qui n’arrive qu’à dire publiquement ce qu’il devrait dire d’une manière courante dans la vie… Il est un peu orgueilleux aussi. C’est finalement très clinique, très médical, l’artiste. Cela dit, le pire c’est l’artiste qui n’est pas artiste, le timide qui ne pond pas son œuf. Alors là c’est effroyable, parce qu’on tombe carrément dans le cas clinique.


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8 de dezembro de 2008

- a gente só queria o amor...


[Conversa de Botas Batidas, Los Hermanos]


A gente corre pra se esconder...
- E se amar, se amar até o fim
- sem saber que o fim já vai chegar

Deixa o moço bater que eu cansei da nossa fuga
Já não vejo motivos pra um amor de tantas rugas
não ter o seu lugar
_________

* só agora percebi o quanto essa música é bonitinha...
parece coisa de Florentino Ariza.
E essa foto que achei na net? Casal lindo, lindo.

6 de dezembro de 2008

Le Chevalier


[Chico Buarque]

J'étais le roi des rois
J'étais le juge et l'idiot de la cour
Et j'inventais des lois
Pour obliger le monde à faire l'amour

imagem: Peynet
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5 de dezembro de 2008

Estudiosa média...


Quando um estudioso mais sábio ouve falar no Tao,
Abraça-o com zelo.
Quando um estudioso médio ouve falar no Tao,
Pensa nele de vez em quando.
Quando um estudioso inferior ouve falar no Tao,
Ri-se às gargalhadas.
Se ele não risse
O Tao não seria o Tao (o Caminho).
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4 de dezembro de 2008

g u i m a




"Não há como um tarde demais - porque aí é que as coisas de verdade principiam."

(Guimarães Rosa)

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1 de dezembro de 2008

Muito Romântico


[caetano veloso]

Não tenho nada com isso, nem vem falar
Eu não consigo entender sua lógica
Minha palavra cantada pode espantar
E a seus ouvidos parecer exótica

Mas acontece que eu não posso me deixar
Levar por um papo que já não deu
Acho que nada restou pra guardar
Do muito ou pouco que houve entre você e eu

Nenhuma força virá me fazer calar
Faço no tempo soar minha sílaba
Canto somente o que pede pra se cantar
Sou o que soa eu não douro a pílula

Tudo o que eu quero é um acorde perfeito maior
Com todo o mundo podendo brilhar no cântico
Canto somente o que não pode mais se calar
Noutras palavras sou muito romântico

[imagem: chema madoz]