30 de junho de 2009

24 de junho de 2009

O Túnel




Ernesto Sábato



Em todo o caso havia um só túnel, obscuro e solitário: o meu, o túnel em que havia transcorrido minha infância, minha juventude, toda a minha vida. E num desses trechos transparentes do muro de pedra eu divisara esta mulher e crera ingenuamente que vinha do outro túnel paralelo ao meu, quando na realidade pertencia ao imenso mundo, ao mundo sem limites dos que não vivem em túneis; e talvez se tivesse acercado por curiosidade de uma de minhas estranhas janelas e entrevisto o espetáculo de minha irremediável solidão, ou lhe houvesse intrigado a linguagem muda, a chave do meu quadro. E então, enquanto eu avançava sempre pelo meu corredor, ela vivia lá fora sua vida normal, a vida agitada das pessoas que vivem do lado de fora, essa vida curiosa e absurda onde há bailes e festas e alegria e frivolidade. E às vezes sucedia que, quando eu passava defronte de uma de minhas janelas, ela estava esperando-me muda e ansiosa (por que esperando? e por que muda e ansiosa?); mas às vezes sucedia ela não chegar a tempo ou se esquecer deste pobre ser encarcerado, e então eu, com o rosto colado ao muro de vidro, via-a ao longe sorrir ou dançar despreocupadamente ou, o que era pior, não a via em absoluto e imaginava-a em lugares inacessíveis ou torpes. E então sentia ser o meu destino infinitamente mais solitário do que havia concebido.

23 de junho de 2009

El Futuro



Julio Cortázar, em Salvo el Crepusculo

Y sé muy bien que no estarás.
No estarás en la calle, en el murmullo que brota de noche
de los postes de alumbrado, ni en el gesto
de elegir el menú, ni en la sonrisa
que alivia los completos en los subtes,
ni en los libros prestados ni en el hasta mañana.

No estarás en mis sueños,
en el destino original de mis palabras,
ni en una cifra telefónica estarás
o en el color de un par de guantes o una blusa.
Me enojaré, amor mío, sin que sea por ti,
y compraré bombones pero no para ti,
me pararé en la esquina a la que no vendrás,
y diré las palabras que se dicen
y comeré las cosas que se comen
y soñaré los sueños que se sueñan
y sé muy bien que no estarás,
ni aquí adentro, la cárcel donde aún te retengo,
ni allí fuera, este río de calles y de puentes.
No estarás para nada, no serás ni recuerdo,
y cuando piense en ti pensaré un pensamiento
que oscuramente trata de acordarse de ti.


imagem: Vilhelm Hammershoi

19 de junho de 2009

Cambalache


Que el mundo fue y será
una porquería, ya lo sé.
En el quinientos seis
y en el dos mil, también.
Que siempre ha habido chorros,
maquiavelos y estafaos,
contentos y amargaos,
varones y dublés.
Pero que el siglo veinte
es un despliegue
de maldá insolente,
ya no hay quien lo niegue.
Vivimos revolcaos en un merengue
y en el mismo lodo
todos manoseaos.

Hoy resulta que es lo mismo
ser derecho que traidor,
ignorante, sabio, chorro,
generoso o estafador...
¡Todo es igual!
¡Nada es mejor!
Lo mismo un burro
que un gran profesor.
No hay aplazaos ni escalafón,
los ignorantes nos han igualao.
Si uno vive en la impostura
y otro roba en su ambición,
da lo mismo que sea cura,
colchonero, Rey de Bastos,
caradura o polizón.

¡Qué falta de respeto,
qué atropello a la razón!
Cualquiera es un señor,
cualquiera es un ladrón...
Mezclao con Stavisky
va Don Bosco y La Mignon,
Don Chicho y Napoleón,
Carnera y San Martín...
Igual que en la vidriera
irrespetuosa
de los cambalaches
se ha mezclao la vida,
y herida por un sable sin remache
ves llorar La Biblia
junto a un calefón.

Siglo veinte, cambalache
problemático y febril...
El que no llora no mama
y el que no afana es un gil.
¡Dale, nomás...!
¡Dale, que va...!
¡Que allá en el Horno
nos vamo' a encontrar...!
No pienses más; sentate a un lao,
que a nadie importa si naciste honrao...
Es lo mismo el que labura
noche y día como un buey,
que el que vive de los otros,
que el que mata, que el que cura,
o está fuera de la ley...

Carlos Gardel


18 de junho de 2009

Certeza


Vem-me triste, te quero
triste, sem cor, de pedra.
Qual mar de gelatina,
de bruma, de arrepio.
Bem branco, sem limites,
onde não reconheça,
nem emoção e afeto,
sem texugo e serpente.
Sê-me grande serpente
de chamas e de mármore,
não javali, não árvore.
Nada, não, não me sejas.
Beija-me e depois vai-te.
Não poderei te amar.


In: Desdesejo, de Narcís Comadira. A imagem também é dele.

14 de junho de 2009

Dia e Noite



E o tempo passava... no devagar depressa do tempo (JGR)

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*finalmente uma imagem que eu sei de quem é... Dia e Noite, Escher.


13 de junho de 2009

7 de junho de 2009

O Inocente



apenas os puros são capazes de certos excessos


Do romance "O Inocente", de Gabriele D'Annunzio, que foi adaptado pro cinema pelo Visconti.

4 de junho de 2009

Eu soube enfim que o amor está ligado a mim.


Cada átomo
Feliz ou miserável,
Gira apaixonado
Em torno do sol


Eu soube enfim que o amor está ligado a mim.
E eu agarro esta cabeleira de mil tranças.
Embora ontem à noite eu estivesse bêbado da taça,
Hoje, eu sou tal, que a taça se embebeda de mim.

.

Se busco meu coração, o encontro em teu quintal,
Se busco minha alma, não a vejo a não ser nos cachos de teu cabelo.
Se bebo água, quando estou sedento
Vejo na água o reflexo do teu rosto.

.

Sou medido, ao medir teu amor.
Sou levado, ao levar teu amor.
Não posso comer de dia nem dormir de noite.
Para ser teu amigo
Tornei-me meu próprio inimigo.

.

Teu amor me tirou de mim.
De ti, preciso de ti
Noite e dia, eu queimo por ti.
De ti, preciso de ti.

.

Não temos nada além do amor.
Não temos antes, princípio nem fim.
A alma grita e geme dentro de nós:
- Louco, é assim o amor.
Colhe-me, colhe-me, colhe-me!

.

À noite, pedi a um velho sábio
que me contasse todos os segredos do universo.
Ele murmurou lentamente em meu ouvido:
- Isto não se pode dizer, isto se aprende.

.

- Vem ao jardim na primavera, disseste.
- Aqui estão todas as belezas, o vinho e a luz.
Que posso fazer com tudo isso sem ti?
E, se estás aqui, para que preciso disso?

.

Sofreste em excesso
por tua ignorância,
carregaste teus trapos
para um lado e para outro,
agora fica aqui.

Na verdade, somos uma só alma, tu e eu.
Nos mostramos e nos escondemos tu em mim, eu em ti.
Eis aqui o sentido profundo de minha relação contigo,
Porque não existe, entre tu e eu, nem eu, nem tu.

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RUMI

.

http://www.sertaodoperi.com.br/poesiasufi/poesia/rumi_colet.htm


Nasrudin


Em dada ocasião, Nasrudin estava em um barco com um homem letrado, quando o Mullá disse algo que contrariava as regras gramaticais:

- Você nunca estudou gramática? - perguntou o estudioso.
- Não, nunca - respondeu Nasrudin.
- Nesse caso, metade de sua vida se perdeu - retrucou outro.
Nasrudin ficou em silêncio durante algum tempo, quando finalmente falou:
- Você nunca aprendeu a nadar? - disse o Mullá ao homem letrado.
- Não, nunca - este respondeu.
- Então, nesse caso, toda a sua vida se perdeu. Estamos afundando.

2 de junho de 2009

It is mightier than swords


[from 'get me away from here', belle and sebastian]


Ooh! Get me away from here I'm dying
Play me a song to set me free!

Thought there was love in everything and everyone
You're so naive...

At the final moment, I cried
I always cry at endings

Into the windows of my lovers
They never know unless I write
"This is no declaration, I just thought I'd let you knowgoodbye"

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* não agüento mais adoecer e ficar deprimida no crato... third time!

1 de junho de 2009

A voz do morto



[caetano veloso]

Ninguém me salva
Ninguém me engana
Eu sou alegre
Eu sou contente
Eu sou cigana

[...]

Ninguém me atende
Ninguém me chama
Mas ninguém me prende
Ninguém me engana

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