“Não importa como nos posicionemos: sempre nos imaginaremos vendo. Acho que o ser humano sonha apenas para não parar de ver. É bem possível que um dia a nossa luz interior emane, para que não necessitemos mais de nenhuma outra”
As coisas mais importantes são as mais difíceis de expressar. São coisas das quais você se envergonha, pois as palavras as diminuem -- as palavras reduzem as coisas que pareciam ilimitáveis quando estavam dentro de você à mera dimensão normal quando são reveladas. Mas é mais que isso, não? As coisas mais importantes estão muito perto de onde seu segredo está enterrado, como pontos de referência para um tesouro que seus inimigos adorariam roubar. E você pode fazer revelações que lhe são muito difíceis e as pessoas o olharem de maneira esquisita, sem entender nada do que você disse nem por que eram tão importantes que você quase chorou quando estava falando. Isto é pior, eu acho. Quando o segredo fica trancado lá dentro não por falta de um narrador, mas de alguém que compreenda.
They cannot scare me with their empty spaces Between stars – on stars where no human race is I have it in me so much nearer home To scare myself with my own desert places.
* * *
[Eles não podem me assustar com seus vácuos interestelares – em estrelas onde não há raça humana. Detenho a capacidade, tão mais perto de casa, de me assustar com meus próprios lugares desertos.]
Não posso me exprimir direito; mas você, como todo mundo, deve ter a crença de que existe, ou deve existir outra vida, à nossa frente. Para que serviria eu ter existido, se ficasse inteiramente restrita aqui? Meus maiores sofrimentos neste mundo têm sido os sofrimentos de Heathcliff; fui testemunha deles e senti-os todos, desde o começo. Meu maior cuidado na vida é ele. Se tudo desaparecesse e ele ficasse, eu continuaria a existir. E se tudo o mais ficasse e ele fosse aniquilado, eu ficaria só num mundo estranho, incapaz de ter parte dele. Meu amor por Linton é como a folhagem da mata: o tempo há de mudá-lo como o inverno muda as árvores, isso eu sei muito bem. E o meu amor por Heathcliff é como as rochas eternas que ficam por debaixo do chão; uma fonte de felicidade quase invisível, mas necessária. Nelly, eu sou Heathcliff. Sempre, sempre o tenho em meu pensamento. Não é como um prazer – porque eu também não sou um prazer para mim própria -, mas como o meu próprio ser.
Há verdade, ainda que não haja verossimilhança, em tudo o que um homem sonha. Uma goiabeira em flor, por exemplo, perdida algures entre as páginas de um bom romance, pode alegrar com o seu perfume fictício vários salões concretos.
A mentira - ,explicou, - está por toda a parte. A própria natureza mente. O que é a camuflagem, por exemplo, senão uma mentira? O camaleão disfarça-se de folha para iludir a pobre borboleta.Mente-lhe dizendo, fica tranqüila, minha queria, não vês que sou apenas uma folha muito verde ondulando ao vento? - e depois atira-lhe a língua, a uma velocidade de seiscentos e vinte e cinco centímetros por segundo, e come-a.
A realidade é dolorosa e imperfeita -, dizia-me: - é essa a sua natureza e por isso a distinguimos dos sonhos. Quando algo nos parece muito belo pensamos que só pode ser um sonho e então beliscamo-nos para termos a certeza de que não estamos a sonhar – se doer é porque não estamos a sonhar. A realidade fere, mesmo quando, por instantes, nos parece um sonho. Nos livros está tudo o que existe, muitas vezes em cores mais autênticas, e sem a dor verídica de tudo o que realmente existe. Entre a vida e os livros, meu filho, escolhe os livros.
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Imaginem um rapaz correndo de moto numa estrada secundária. O vento bate-lhe no rosto. O rapaz fecha os olhos e abre os braços, como nos filmes, sentindo-se vivo e em plena comunhão com o universo. Não vê o caminhão irromper do cruzamento. Morre feliz. A felicidade é quase sempre uma irresponsabilidade. Somos felizes durante os breves instantes em que fechamos os olhos.
Só o amor em linhas gerais infunde simpatia e sentido à história, sobre cujo fim vogam inexatidões, convindo se componham; o amor e seu milhão de significados. [JGR]
No entanto, acho que se eu vestir algo que gosto, prender o cabelo e levar os cachorros comigo, me sentirei suficientemente forte para ir até a loja e comprar suco de laranja.
[...] No dia seguinte, ela estava se sentindo melhor, comeu duas vezes e comprou um par de meias.
[Andrew Solomon apud BARBARA, Vanessa. A Hortaliça. n. 82. São Paulo: Hortifruti, abril/2010]
"Pouco a pouco, um dia, pude. Apliquei meu coração a isso, vislumbrei entre névoas, em altura longínqua profunda, a minha estrela-da-guarda. Ah, revê-la. lembrou-me algo de maior, imensamente mor - o que podia valer-me. Como surge a esperança? Um ponto, um átimo, um momento. Face a mim, eu. Àquele ponto, agarrei-me, era um mínimo glóbulo de vida, uma promessa imensa. Agarrei-me a ele, que me permitia algum trabalho de consciência. Sofria, de contrair os músculos. Esta esperança me retorna, agora, mais vezes, em certos momentos. É quando me esforço por reunir as células enigmáticas, confiar em que possa, algum dia, conseguir-me a desassombração, levantar o meu desterro. Sofro, mas espero. Antes da experiência, profundamente anímica. Tenho de tresmudar-me. Sofro as asas".
Páramo, in Estas Estórias, João Guimarães Rosa
9 de abril de 2010
"Imortal é o que é do sofrido e espírito; tudo, abaixo daí, é póstumo"
Nem semanas nem meses - anos
levamos nos separando. Eis, finalmente,
o gelo da liberdade verdadeira
e as cinzentas guirlandas na fachada dos templos.
Não mais traições, não mais enganos,
e não me terás mais de ficar ouvindo até o amanhecer,
enquanto flui o riacho das provas
da minha mais perfeita inocência.
Nas horas vagas, Álvaro ganha um salário mínimo demonstrando videoquês nas Casas Pernambucanas. Ele e Matilde revezam-se em “Como é grande o meu amor por você”. Nem mesmo o céu, nem as estrelas, nem mesmo o mar e o infinito. O Álvaro, sempre calmo e sorridente, aprecia as paisagens bucólicas na tela enquanto pensa: podia ser um tenor barrigudo espanhol, ah se podia. Daqueles que abrem os braços e cantam como loucos.
O sonho de Matilde é deitar em cima de um piano, vestida de vermelho, e flertar com o microfone.
[76]
Ou então: Álvaro é infeliz. Passa os dias imóvel, preso em uma jaula e envolto por correntes que atam seus pulsos à parede. Álvaro não vê o sol; não come, não dorme e costuma chorar durante meses a fio. Só narra os avisos sonoros no microfone do Tietê quando o fustigam com um espeto de churrasco.
[77]
Talvez Álvaro ganhe meias no Natal. Sua esposa é secretária e cuida dos três filhos: um loiro, o outro teimoso e um que tem terríveis dores de garganta porque ainda não tirou as amídalas. Ele acorda sempre às seis da manhã, compra bisnagas de leite, tira o Uno da garagem e vai trabalhar na sala de controle do terminal do Tietê. Álvaro não gosta do serviço, já que é obrigado a repetir as mesmas coisas com aquela voz monocórdia e formal; ele queria mesmo é poder cantar antigos boleros em frente à estação do metrô, junto a três velhinhos cegos e um cão triste.
Desde que cheguei aqui tive que me decidir. Vou ficando, vou vivendo ou devo partir? Fui ficando, fui vivendo, fui partir.. era muito tarde! Quase que parto (mas estava inseguro), quase que embarco num sonho maduro. Quase me curo, quase, eu juro! Quase dou um grande salto para o futuro.
Fiquei no caminho (faltou só um pouquinho).
Nunca estive tão perto de ser feliz... olha!, só não deu certo porque eu não quis: vi a sorte a um palmo do meu nariz.
(...)
Quase fiz tudo certo pra ser feliz... quase que eu fiz de tudo mas eu não fiz!
it may not always be so; and i say it may not always be so; and i say that if your lips, which i have loved, should touch another's, and your dear strong fingers clutch his heart, as mine in time not far away; if on another's face your sweet hair lay in such a silence as i know, or such great writhing words as, uttering overmuch, stand helplessly before the spirit at bay;
if this should be, i say if this should be- you of my heart, send me a little word; that i may go unto him,and take his hands, saying, Accept all happiness from me.
Then shall i turn my face, and hear one bird
sing terribly afar in the lost lands.
I've posed for pictures with Iv'ry Soap,
I've petted stray dogs, and shied clear of dope
My smile is brilliant, my glance is tender
But I'm noted most for my unspoiled gender
I've been made Miss Reingold, though I never touch beer,
And I'm the person to whom they say, "Your sweet, My Dear."
The only etchings I've seen have been behind glass,
And the closest I've been to a bar, is at ballet class.
Prim and proper, the girl who's never been cased,
I'm tired of being pure and not chased.
Like something that seeks it's level
I wanna go to the devil.
...
I wanna be evil, I wanna spit tacks
I wanna be evil, and cheat at jacks
I wanna be wicked, I wanna tell lies
I wanna be mean, and throw mud pies
I want to wake up in the morning
with that dark brown taste
I want to see some dissipation in my face
I wanna be evil, I wanna be mad
But more that that I wanna be bad
I wanna be evil, and trump an ace,
Just to see my partner's face.
I wanna be nasty, I wanna be cruel
I wanna be daring, I wanna shoot pool
And in the theatre
I want to change my seat
Just so I can step on
Everybody's feet
I wanna be evil, I wanna hurt flies
I wanna sing songs like the guy who cries
I wanna be horrid, I wanna drink booze
And whatever I've got I'm eager to lose
I wanna be evil, little evil me
Just as mean and evil as I can be